Ver para mim é talvez o que de mais importante existe. Não o ver por ter de ver, mas o ver indo vendo. Numa tremenda sensação de continuidade e forma, de uma imagem que rouba uma outra mais antiga e tudo o que nela encontrei. Temo que a visão quando olhada – como um túnel relembrando cornucópias, possa bem ser mais que a própria família. Não que coisa alguma tenha a ver nem que seja possível de medição aritmética mas deu-me agora um medo em estado latente quando já quase minha mente dormia enquanto meus olhos permaneciam despertos que cheguei a temer aquilo mesmo que via sem pensar.
O candeeiro do meu quarto é tão aprazível que chego a escrever só de olhar para ele, como a cafeína em estimulante. Agora mesmo chego a temer que sua luz se apague e me reste o escuro para escrever. Sou talvez como um raio, um movimento directo que precise de uma causa – efeito demasiado obvia para agir. Repugno tanto a dependência humana e afinal eu mesma não me vejo sem esta luz.
Ele é talvez o que de mais belo há no quarto. Ele e este silêncio primoroso. Os dois: um escrevendo e o outro segurando as palavras.
Têm-me dito que a música é importante – é quase como se me faltasse uma parte do corpo, talvez um pé…
Porém, só me resto em silêncio.
Muitas vozes é aliás como uma orquestra desafinada, talvez mesmo uma boa orquestra. É uma espécie de acumulação de sons que encobrindo a singularidade de cada um denuncia isso mesmo: o fatídico que há no conjunto. Um grupo de pessoas para mim é sempre fatal em si mesmo - pelos corpos sozinhos e únicos que vejo desfazerem-se no chão.
Ao menos o silêncio vem de dentro.
Pensei também no toque dos corpos de que falam os amantes, mas nada disso me entristece mais que ficar sem poder olhar.
Talvez o ouvir. Talvez as palavras saindo de uns lábios desejados, indesejados, seja tão próximo de mim como o olhar. Mas vindo de mim, estando eu em causa sou sempre muito ingrato nessa minha posição – pois que anseio ouvir até à exaustão na busca de me surpreender. E minha ânsia é tanta que chego a esquecer-me de falar…
É melhor falar-se ou ouvir-se? Nunca soube responder.
Tive sempre uma obsessão louca pelo prazer. Como se ele fosse meu Norte. E a ser assim não me contento com o meu prazer, mas desejo ainda mais o prazer do outro. Para que na mesma sala tenha um prazer a dobrar… O meu parece-me tão pequeno sozinho. É talvez mais do que isso. Eu desejo o vosso prazer, e assim o meu será sempre três vezes menor.